Por Maurício Del Buono Ramos*
A complexidade de um mundo em constante transformação torna o trabalho das lideranças ainda mais desafiador. Diversidade de pontos de vista, pressão por resultados ao mesmo tempo em que se valorizam as demandas sociais, limitações de poder, ESG, IA, soft skills, Mundo VUCA ou BANI… São muitos os desafios que atravessam a gestão atualmente. Para lidar com tudo isso e muito mais, o perfil da liderança precisa ser bem diferente do que era de costume no tempo dos nossos ancestrais.
Nas minhas aulas no curso de pós-graduação na FESP (Fundação Escola de Sociologia e Política), discutimos ideias e formatos predefinidos e preconcebidos do que deveria ser um líder. E me vem sempre a reflexão que um indivíduo não pode ser moldado com base em outras pessoas que já exerceram o papel de liderança ou de comportamentos no âmbito histórico.
Quando se fala em liderança surgem as referências militares: Marco Aurélio, Maquiavel. No contraponto, estão as novas biografias de empresários de sucesso. Esses modelos, no entanto, tentam moldar as pessoas em uma suposta ideia do que seria um líder bem-sucedido. Mas será que todos se encaixam em modelos predeterminados? Será que o mundo está pedindo por líderes que seguem fórmulas prontas? Obviamente, não!
O meu trabalho em mentoria segue em uma linha que parte do pressuposto que todo mundo é plenamente capaz de exercer um papel de liderança. Cada um tem elementos dentro de si que possibilitam executar essa função. O que se precisa encontrar é: “onde a pessoa se torna líder”, “como ela lidera”? Para buscar responder a essas duas questões de forma assertiva, não se pode optar por determinar isso de cima para baixo (seguindo padrões e modelos). Em vez disso, é preciso vivenciar o autoconhecimento.
Mentoria para buscar a identidade da liderança
Um pouco antes do lockdown, ministrei uma mentoria coletiva que recebeu o nome de Máscaras da Liderança. Foram três dias de retiro, em que oito CEOs com experiências bem diversas, quatro mulheres e quatro homens, puderam vivenciar como se relacionavam como líderes.
A vivência buscou encontrar, na pessoa, a maneira como ela consegue liderar, que é diferente em cada um. Não tem como criar um padrão. Uma pessoa pode liderar por vínculo afetivo, outra por vínculo de humor, outra, ainda, pelo carisma. Somos pessoas diferentes e cada um tem em si essa capacidade de liderar, só tem que descobrir a sua própria identidade.
De outra forma, o líder que vive na superficialidade de imitar padrões ou ideias preconcebidas pode ter dificuldade de transmitir confiança aos liderados. E, assim, fica difícil conseguir criar um vínculo mais íntimo, que se estabelece apenas por meio da confiança e da autenticidade.
Para trazer esses aspectos à tona, utilizo um combinado de metodologias, como exercícios preparatórios de relaxamento, liberação muscular ou respiração, que permitem aos participantes se desligarem das tensões e se conectarem com uma percepção maior do entorno. Tendo essa percepção, o indivíduo inicia um processo de envolvimento com elementos intrínsecos dentro de si. Também busco utilizar jogos de teatro, como teatro de máscaras, além de jogos corporativos.
Neste processo, priorizo o corpo e não o intelecto. Proponho movimento; o grupo precisa se locomover muito e pouco se fala. Há uma infinidade de respostas que estão no corpo!
Comunicação tem aspectos conscientes e inconscientes
Outro ponto importante também é a comunicação. O mundo corporativo é muito restrito à comunicação verbal e racional. No máximo, trabalha-se a Comunicação no Figurino, como costumamos falar no teatro, que é a comunicação dos aspectos estéticos (valoriza a roupa que cada um usa, a marca). Porém, existem outras vertentes, no nível da comunicação inconsciente, que se trata da posição do corpo, da maneira de andar.
Quando eu faço um trabalho de preparação de corpo, eu vou destrinchando tudo isso. A dica é: “preste atenção ao que o seu corpo está comunicando, ao que o outro está entendendo, não de forma consciente. A maneira como você está se movimentando transmite que você é uma pessoa confiável”? Por meio de reflexões neste sentido, eu vou “isolando” aspectos conscientes da comunicação e vou trabalhando em cima deles.
Então, na comunicação, há desde aspectos técnicos conscientes, como a comunicação verbal, em que é possível se trabalhar a projeção da voz, a eloqüência, pois a maneira como um indivíduo fala pode criar ou não uma conexão com o próximo. Até chegar na comunicação não-verbal, na preparação corporal. Como se prepara um corpo para ficar 8, 10 horas em uma reunião ou para se apresentar para um cliente, para uma entrevista de emprego.
De alguma forma, tanto a comunicação como a capacidade de descobrir o potencial do líder em si mesmo envolvem processos de autoconhecimento. E, citando um trecho do livro “Liderando pela Essência” (Jaime Moggi): “Todo processo de autodesenvolvimento acontece com a máxima de autoconhecimento…Quando discorremos sobre o desenvolvimento de nossa capacidade de liderança, estamos, em essência, falando em permitir que nosso potencial, como seres humanos, se expresse em sua totalidade. Permitir ser tudo aquilo que ‘eu’ posso ser. Que aquelas competências existentes em potência dentro de nós se tornem manifestas. É um caminho estreito, cheio de perigos e desafios, mas, também, cheio de recompensas”.
*Maurício Del Buono Ramos faz parte do grupo de mentores do CEOlab. É consultor e facilitador de treinamento de desenvolvimento humano. É ator, professor universitário e utiliza elementos teatrais e da psicologia social em suas oficinas e mentorias. Ministra oficinas de liderança e de preparação corporal.