Por Paulo Henrique Ferro (*)
“O rio quando encontra o oceano deixa de ser rio, mas o oceano continua sendo oceano, um pouco transformado” – Autor desconhecido.
Existe um mundo em torno da liderança, seja do ponto de vista teórico acadêmico ou mesmo prático. De certo, é preciso estudar o tema como um todo. A escolha que faço em mentorias é partir da minha experiência, como gestor e conselheiro por mais de 40 anos.
Desde que ocupei meus primeiros cargos de direção como C-Level, comecei a anotar as experiências vividas que me impactavam na carreira e na vida. Registrava apenas na forma de títulos, que depois sistematizei em tríades.
Tríades são diagramas que dão uma conotação sucinta a alguma coisa. Funcionam como um excelente suporte para fazermos análises e comunicarmos a essência de algo. Podem ser utilizadas em várias situações quando queremos colocar foco.
Na questão da liderança, a partir da minha experiência, organizei e registrei quatro dimensões de tríades que recomendo aos líderes, sobretudo aos que estão iniciando como C-Levels, que estudem e considerem na busca do seu contínuo desenvolvimento.
Saúde Empresarial
A tríade “Tendências/Proposta de Valor – Oportunidades – Risco” significa olhar para o negócio, para o que eu entrego além do preço, qualidade e prazo de entrega. Trata-se da proposta de valor, o que eu realmente transcendo para além das questões intrínsecas do meu produto ou serviço.
Aqui o foco é a saúde do negócio, do empreendimento. Sem uma proposta de valor sólida e articulada, é possível que a empresa seja prejudicada principalmente em sua perenidade.
O que devemos nos perguntar nesta tríade é “consigo ouvir o inaudível?”, “consigo ver o invisível?”, “consigo ver a grama crescer?”.
Por mais que a nossa visão seja um sentido dominante, muitas vezes a gente pode não estar reparando em algo que está bem diante dos nossos olhos. Muitos produtos rompedores de mercado vêm de alguém que viu algo, imaginou alguma coisa, e materializou essa visão na forma física. Como na escultura de Michelangelo; segundo ele, a obra final já estava lá na pedra bruta, só foi preciso lapidar e tirar o excesso.
Saúde Financeira
Em “Caixa – Preços – Salários”, o foco é obviamente a saúde financeira da empresa. Neste sentido, é preciso que a liderança conheça custo, tenha uma boa noção de salários e benefícios. São itens muito importantes que potencializam e, por trás disso, vem a produtividade. Em geral, falhar no diligente acompanhamento e ação, se necessária, pode se tornar desastroso.
Caixa é rei dentro da empresa. Se você tem um problema com caixa pode ser o último que terá. Basta ver a coletânea de empresas que estão falindo por conta disso. Uma máxima dizia que “as empresas quebram pelo caixa, não pelo balanço”, em uma alusão de que todas as virtudes e talentos ou equívocos da gestão desembocam no caixa.
As perguntas-chave de um líder neste sentido têm a ver com senso de urgência e com conhecimento. Qual o momento de intervir e o de não fazer nada? O que eu não sei e o que preciso buscar saber?
Em princípio: um líder é um generalista; pode ter ênfase maior em uma ou outra área, mas precisa ter conforto para navegar nas temáticas que forem essenciais ao seu negócio.
O que importa é ter consciência sobre o que precisa saber. Ser um líder é desenvolver uma visão ampla de contexto, saber com clareza para o que dizer sim e o mais difícil, para o que dizer NÃO; esta última, uma habilidade trabalhosa de ser desenvolvida.
Saúde Mental
“Coerência – Transparência – Respeito” tem a ver com relações, com a cultura da empresa. Esta tríade pode estar na raiz da saúde mental dos indivíduos e dos grupos. O líder tem que estar conectado em construir um ambiente de confiança, fazer o que fala e estimular os liderados a abraçarem a prática da empatia de maneira genuína.
O que estamos observando nos tempos atuais é que, por conta de disfunções nesta tríade, assédio, burnout e outros problemas de saúde mental são uma preocupação constante.
Para refletir sobre isso, o líder deve se perguntar: “como eu desenvolvo um grupo maduro?”, “como lidar com esse mundo imperfeito?”.
Observo as pessoas reclamando do mundo, da companhia, do time, do parceiro, do chefe, das catástrofes, da guerra. Parece que a maioria tem uma expectativa de que o mundo é um poço de perfeição. Só que sabemos que o mundo, assim como o ser humano, é imperfeito. O que me resta fazer? Aprender a lidar com isso continuamente.
É preciso que a liderança tenha essa habilidade, essa tranquilidade de lidar com o mundo imperfeito, que não se assuste com a imperfeição que está em volta de todos nós. Outro ponto fundamental é cuidar das relações, pois elas exercem forte impacto sobre as corporações.
Saúde Espiritual
“Minhas Raízes – Meus Encontros – Minhas Escolhas” se resume à saúde espiritual. É o acervo de experiências de cada pessoa e como ela lida e reage aos acontecimentos, com as fraquezas tanto minhas como a dos outros.
A empatia está muito próxima da espiritualidade do ponto de vista antroposófico. A minha visão de mundo já diz um pouco do meu espírito. É triste ver as pessoas que se deixam levar pelo “sensacionalismo” do noticiário, que está na casca e não na essência, e não investem em desenvolver uma metavisão, que vai além do significado das coisas que o passado está nos entregando e das obviedades contidas no presente e, muitas vezes, no próprio futuro que pensamos.
A saúde espiritual vem fundeada no autoconhecimento. Um grande caminho para isso é a biografia humana, que atribui significado a esses fatos no tempo e ressignifica para hoje. Isto é um exercício espiritual muito importante, pois traz nutrição e provê força para o momento em que se está vivendo e também impulsiona o autoconhecimento.
A grande pergunta nesta tríade é “como tomar a minha vida nas minhas próprias mãos?”.
O mundo está voraz por nos absorver, sequestrar nosso “eu”, mas há muitos casos que indicam que é possível defender-se destes ataques; nos mais variados aspectos e dimensões. Desde que se invista no espiritual e no conhecimento de si mesmo. Daí, novamente, o autoconhecimento aparece como uma força imperiosa para as lideranças.
Este artigo é um recorte da vida prática e que nos remete à frase que inicia este texto, podendo nos revelar um sentido mais profundo da liderança que resumo assim:
“A liderança quando flui pela organização e encontra a sociedade deixa de ser liderança e passa a ser parte do mundo, um pouco transformado”.
(*) Paulo Henrique Ferro é consultor sênior, mentor certificado do CEOlab, coach PCC e mediador organizacional.
Neste texto não foi usado nenhum recurso de IA.