O que é governança corporativa e por que estar atento a ela?

No fim do ano passado, a saída do CEO da Tesla, Elon Musk, da presidência do conselho da empresa despertou uma discussão no mercado. Pode o CEO de uma organização exercer ao mesmo tempo a presidência do conselho de administração? Na Amazon e no Facebook, com Jeff Bezos e Mark Zuckerberg respectivamente, essa situação de acúmulo de funções também ocorre, assim como em outras empresas de tecnologia. E, nos dois casos, o mercado contesta, com maior indignação em relação ao Facebook, já que a empresa de investimentos Trillium Asset Management chegou até mesmo a apresentar uma requisição de acionistas para que Zuckerberg deixasse a presidência do conselho. Até o momento, tal pedido não surtiu efeito. O motivo para a indignação está relacionado com a governança corporativa, já que a concentração de poder nas mãos de uma pessoa não é recomendável jamais por representar um risco para o negócio.

De acordo com a quinta edição do Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa, elaborado pelo IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa), governança corporativa é o “sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e demais partes interessadas”. Nesse sistema, ainda segundo o IBGC, o que importa é alinhar os interesses da companhia com a preservação e otimização do seu valor econômico de longo prazo, facilitando o acesso a recursos e contribuindo para a qualidade da gestão, sua longevidade e o bem comum.

Cada um dos agentes citados no parágrafo anterior tem sua razão de existir. Quanto ao conselho de administração, ele deve atuar como intermediário entre os acionistas e o CEO. Sua principal responsabilidade é acompanhar o trabalho do CEO, fiscalizar suas atividades. Quando o CEO exerce também essa função, essa lógica é rompida, o que pode resultar em desobediência aos princípios que garantem boas práticas de governança corporativa. Tais princípios estão presentes nos códigos de conduta elaborados pelas organizações. 

Princípios da governança corporativa

1) Transparência

A empresa está preocupada em disponibilizar para as partes interessadas as informações que sejam do interesse delas. A transparência vai além do que exige o dever de informação previsto nas leis e nos regulamentos. Não se restringe assim ao desempenho financeiro. Envolve também outros fatores, inclusive intangíveis, que norteiam a gestão e que estão, portanto, relacionados com o dia a dia da organização.

2) Equidade

É o tratamento justo e isonômico concedido a todos os sócios e demais stakeholders. Para que isso seja possível, a empresa deve levar em consideração os direitos, os deveres, as necessidades, os interesses e as expectativas de cada público envolvido com o negócio.

3) Prestação de contas ou accountability

Os agentes da governança, como sócios, diretoria e conselho de administração, devem prestar contas da sua atuação. Agir com clareza e tempestividade é o comportamento esperado. Cada agente deve justificar suas ações, atuando com diligência e assumindo as consequências dos seus atos e das suas omissões. 

4) Responsabilidade corporativa

Esses mesmos agentes de governança devem ter como norte a viabilidade financeira da organização, mas não a qualquer custo, motivo pelo qual as externalidades do negócio e das operações devem ser reduzidas. Com o aumento das externalidades positivas, é natural que os públicos interno e externo reconheçam a responsabilidade da organização. Para que esse processo ocorra, de elevação das externalidades positivas, os planos de ação devem levar em conta os diversos capitais (intelectual, humano, social, produtivo, ambiental e financeiro, por exemplo) no curto, médio e longo prazos 

5) Estatuto ou contrato social bem formulado

Antes de mais nada, vale a pena diferenciar estatuto de contrato social. Ambos são uma espécie de certidão de nascimento da pessoa jurídica. Só que o estatuto deve ser utilizado pelas sociedades em ações, pelas cooperativas e pelas entidades sem fins lucrativos. Já o contrato social diz respeito às demais sociedades, como as sociedades simples. Ambos complementam a legislação na medida em que estabelecem a forma de funcionamento da organização, o que inclui as atribuições de cada agente de governança. É preciso que sejam bem redigidos para que seu conteúdo faça diferença no dia a dia. 

Centro de Governança Corporativa 

Recentemente, a Nasdaq Inc. criou um núcleo dedicado a estimular as boas práticas de governança corporativa. Sua avaliação está fundamentada em seis áreas: composição da diretoria, tecnologia da informação, gerenciamento de capital humano, preocupação com o meio ambiente e com a sustentabilidade do negócio, engajamento do investidor e esforços de comunicação.

O primeiro relatório do Centro de Governança Corporativa da Nasdaq, que analisou as empresas do índice S&P 100 a partir das suas declarações de procuração (aquelas exigidas de uma empresa ao solicitar votos dos acionistas) e dos seus sites de sustentabilidade, fez as descobertas abaixo.

– 92% divulgam periodicamente para os investidores relatório de atividades;

– 80% das companhias mencionaram que meio ambiente e sustentabilidade são prioridades do negócio;

– 53% enfatizam a importância da diversidade e da inclusão;

– 48% destacam a cultura da companhia e os seus valores.

 

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Sobre o CEOlab
Cada vez mais, a mentoria aparece como uma fonte valiosa de aprendizado para qualquer profissional. No CEOlab, consultores e conselheiros de carreira renomada, que ocuparam cargos de liderança como o de CEO, trabalham o indivíduo com ele mesmo, o indivíduo na organização e a organização na sociedade. São soluções sob medida elaboradas por executivos experientes que compartilham seus métodos de trabalho multiculturais e multidisciplinares nos mais diversos campos de atuação nacionais e internacionais. 

É preciso liderar a distribuição do futuro

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Por Ronaldo Ramos*

“O futuro está aí – só não está plenamente distribuído.” A frase do visionário William Gibson, autor da trilogia Sprawl – que inspirou os filmes Matrix –, é motivo extenso para debate independentemente da época. Em nossa realidade, pode significar a redistribuição, em um cenário de consumo excessivo e recursos naturais escassos, no qual o compartilhamento das riquezas e bens torna-se fundamental para a prosperidade do planeta e da humanidade.

A ficção retratou a queda da Nação como modelo, pessoas modificadas por próteses de membros ou biochips, cidades inteiras situadas em órbitas espaciais, lutas pelo poder entre grandes corporações e uma espécie de alucinação coletiva digital, a Matrix, acessada por computadores, na qual a humanidade inteira está conectada. Uma sociedade movida a prazeres e totalmente dominada por máquinas criadas exclusivamente para produzir ilusões de que uma nova vida, aquela utopia que sonhamos, pode ser vivida.

As lideranças do mundo dos negócios, da política, do terceiro setor, de sindicatos ou de grupos comunitários têm um papel decisivo no desempenho de suas organizações. O posicionamento que assumem perante a sociedade e diante de assuntos polêmicos, a forma como interagem com as pessoas, o tempo de resposta diante de uma crise iminente são alguns dos fatores que podem ser decisivos para a formação da reputação e da imagem de uma instituição.

A partir de uma análise etimológica, entretanto, descobrimos que um líder, além de assumir a responsabilidade por determinado setor ou atividade, é também uma pessoa que exerce influência sobre o comportamento, o pensamento ou a opinião das pessoas – para o bem ou para o mal. E isso passa, inevitavelmente, por uma boa comunicação.

Segundo Harsey, 1986, a partir da concepção do homo social, surgiu a necessidade de um líder que facilitasse a relação das pessoas no grupo e que orientasse o grupo no alcance dos objetivos organizacionais. O líder passou, então, a concentrar-se nas necessidades das pessoas enquanto seres sociais, como forma de atingir as metas da organização.

“Há que se considerar, também, que os acontecimentos dramáticos que se observa universalmente, quer se trate da deteriorização da condição física, psíquica e cultural de grande parte da humanidade, da violência, dos conflitos que minam todos os patamares da sociedade, das ameaças que planam sobre o equilíbrio ecológico e do globo e do estado de confusão que reina ao nível dos valores morais e éticos, exigem imperiosamente que nos interroguemos, com maior rigor, sobre as consequências do triunfo do economismo de vista curta e sobre as finalidades da empresa, instituição que acabou por se transformar no pivô em torno da qual todas as outras instituições gravitam.”
Alain Chanlat

Nunca precisamos tanto de solidariedade como agora, e de que forma o CEO pode fazer o seu trabalho de maneira consistente? Preservar mercado? Manter os consumidores dentro de determinadas faixas de poder aquisitivo? As responsabilidades do CEO se confundem com as do cidadão e, portanto, não podemos mais abrir mão de considerar diversos parâmetros durante a elaboração dos planos estratégicos.

Normalmente, nos preocupamos muito com a qualidade da informação e do conteúdo acadêmico de nossos ciclos de planejamento estratégico e de execução em busca de excelência operacional. Esquecemos de refletir sobre a qualidade do elemento humano que vai desenvolver o planejado e suas diversas dimensões de percepção na vida e no trabalho.

Na sustentabilidade, o ciclo de vida do produto é apenas um dos elementos. E os outros? Por quanto tempo os efeitos colaterais da produção e do uso do produto permanecerão? E de seus resíduos? E os efeitos sobre os consumidores e empregados? Sou dono ou inquilino? Do Planeta? Do País? Da comunidade onde vivo? Das comunidades de consumidores e colaboradores? Dos vizinhos?

Líderes empresariais e intelectuais sofisticados já sabem disso; começam a surgir elementos promissores de um novo modelo. Ainda não temos, no entanto, um marco geral para nortear essa iniciativa — e a maioria das empresas continua presa a uma mentalidade de “responsabilidade social” na qual questões sociais estão na periferia, não no centro.

Recente pesquisa da universidade de Georgia, nos Estados Unidos, mostra que 25% dos lucros de uma empresa podem ser atribuídos à gestão do CEO. Nos anos 1960 e 1950, esse número ficava entre 6% e 8%. Mas quais aspectos tornaram maior a importância do CEO?

Em primeiro lugar, mesmo em um ambiente de negócios onde o conselho e outros altos executivos têm influência crescente, o CEO dá o tom da organização e tem o poder de decisão de contratar ou reter profissionais-chave. Hoje, ele também pode promover mudanças importantes em questão de semanas. Há 50 anos, o mundo não se movia com tamanha velocidade. Aliado a isso, a tendência de diminuição dos níveis hierárquicos favoreceu a rapidez da tomada de decisão dentro da organização.

Outro aspecto é a estrutura de remuneração para altos executivos, que incentiva o risco. Isso encoraja os CEOs a tomarem muitas decisões, na esperança de serem recompensados por uma boa remuneração variável. A pesquisa, de autoria do professor de administração Tim Quigley, analisou o desempenho de companhias americanas nos últimos 60 anos. Foram isolados aspectos como as condições econômicas do período, diferenças entre setores e o histórico de cada empresa.

O capitalismo é um veículo inigualável para a satisfação das necessidades humanas, o aumento da eficiência, a criação de emprego e a geração de riqueza. Só que uma concepção estreita do capitalismo impediu que a atividade empresarial explorasse todo seu potencial para enfrentar os grandes desafios da sociedade. As oportunidades sempre estiveram aí, mas foram negligenciadas.

Zygmunt Bauman no seu trabalho Modernidade Líquida (2001) faz um pertinente estudo das transformações de nossa época e que passaria da “solidez” de um capitalismo “pesado” para a fluidez de um capitalismo “leve” que movimenta os moinhos do hiperconsumo. As metáforas entre “sólido” e “líquido” são muito mais profundas do que aparenta, sendo possível criar uma distinção entre estes dois momentos díspares.

O consumo colaborativo baseia-se em um conceito simples: alavancar valor de ativos que não estão sendo totalmente explorados por seus donos. Um dos programas de pesquisa da University of Innsbruck busca identificar modelos de negócio inovadores enquanto é criado valor para a comunidade. Nesse contexto, estudou o compartilhamento de ativos, o que foi a base para o artigo do MIT Sloan Management Review sobre o tema.

Sem dúvida um conceito com menor foco no consumo e maior foco na troca tem um impacto reduzido nos recursos naturais, tornando-o um negócio que contribui para a sustentabilidade. Isso mesmo, o conceito é explorado como um negócio e, portanto, pode tornar-se uma oportunidade para empresas e investidores.

De acordo com o artigo, uma pesquisa da PricewaterhouseCoopers revelou que o mercado global de produtos e serviços compartilhados, ou de consumo colaborativo, poderá chegar a US$ 335 bilhões em 2025. Além disso, esse mercado tem apresentado um rápido crescimento nos últimos anos.

As consequências de meus atos serão por mim acompanhadas pelo período médio atual de 100 anos de idade, sendo ativo na carreira até, quem sabe, 75 ou 80 anos. Meus conhecimentos e minha qualidade de execução precisam abranger esta longevidade, mesmo sendo o CEO à frente de uma organização por um tempo infinitamente menor, em torno de 5 anos mais ou menos. Em vista disso, quem é o planejador e o que ele considera como seu horizonte?

*Fundador do CEOlab e professor associado da FDC
ronaldo.ramos@ceolab.net

A complexidade como novo paradigma do trabalho

Foto de Ronaldo Ramos

Por Ronaldo Ramos*

Há diferenças fundamentais entre problemas complicados e problemas complexos, como tive a oportunidade de citar em artigos anteriores. Há também diferentes técnicas de abordagem e uma grande confusão originada na crença de que podemos enfrentar problemas complexos com o ferramental tradicional. Não há dúvida de que as situações que vivemos hoje são de natureza primordialmente complexa.

De acordo com o livro Seis Regras Simples – Como administrar a complexidade sem ficar mais complicado (Six Simple Rules – How to manage complexity without getting complicated), de Yves Morieux e Peter Tollman, vivemos em um mundo de crescente complexidade onde ainda encontramos duas abordagens gerenciais preferenciais.

Uma é focada em processos, regras, tempos, métodos e na crença de que o ser humano é o elo mais fraco da cadeia produtiva e, portanto, precisa ser acompanhado e vigiado, com normas claras de procedimento, monitoração e controle. A chamamos de abordagem “hard”. A outra reside na ideia de que o importante é o emocional; os empregados precisam se sentir satisfeitos para produzir mais e atuam sob a formação de equipes, ambiente de trabalho e demais elementos. Como se subíssemos na cadeia das necessidades individuais, priorizando a autoestima e o bem-estar social no ambiente de trabalho.

As duas pretendem prever e determinar com precisão qual o comportamento humano adequado e as receitas que devem ser seguidas por todos os empregados e contratados de uma organização. Assumimos que, desta forma, a produtividade aumentará, já que estarão satisfeitas as necessidades dos trabalhadores, sejam elas prioritariamente de subsistência ou de outros níveis de realização individual.

Ainda segundo os autores, dificilmente se escapa de uma crescente complicação de procedimentos, normas e processos nas empresas que adotam os pensamentos e crenças acima. Prestação de contas, trabalho de pouco valor agregado e criação de mais camadas de supervisão acabam sendo observadas, o que leva a um crescente “desengajamento” por conta da intensa padronização de métodos e processos, sem deixar espaço para criatividade e individualidade.

Excluo qualquer pretensão de questionar a necessidade de normas rígidas de operação em ambientes hostis – ou que representem risco para o empregado –, e regras de qualidade que, caso não atendidas, ameacem a sociedade e o consumidor. O assunto se refere à premissa de como o ser humano se encaixa na organização e de que maneira ele quer ser percebido e valorizado.

Todas as abordagens partem da ideia de que os seres humanos precisam se adaptar a determinados padrões de comportamento e procedimento (incluindo aquele esperado por regras simples de convivência, respeito e conduta), dentro de uma perspectiva tradicional. E sofrem na prática por experimentar mais do mesmo nas tentativas de lidar de forma cada vez mais intensa com a questão do “desengajamento” – frequentemente atribuído ao número de gerações no mercado e às suas diferenças de expectativa em relação à hierarquia, trabalho, lazer e pluralidade de preferências.

Com frequência, observamos companhias que hoje se preocupam cada vez mais com o crescente número de casos de estresse, burnout, suicídio e outros distúrbios mentais relacionados ao trabalho. A psicologia positiva tenta trabalhar com a questão utilizando um enfoque que procura preferencialmente conscientizar indivíduos de seus pontos fortes e de como os usar para suplantar dificuldades, lembrando-os de que são estes pontos fortes os verdadeiros motivos de seu sucesso.

A natureza da complexidade está na realidade de que nenhum indivíduo tem a resposta completa, as variáveis aparentemente independentes possuem alto grau de correlação com outras e é igualmente necessário que as pessoas usem sua autonomia para cooperar umas com as outras, colaborando para uma dinâmica maior.
Curiosamente, lembro de meus avós me dizendo que para crescer eu precisaria sempre saber ter liberdade com responsabilidade. Naquela época, não entendi bem o que isso significava, mas agora parece que tudo faz sentido.

As etapas de desenvolvimento humanas – que passam por dependência, quando na infância; independência, que começa a partir da adolescência; e interdependência, que caracterizaria a fase adulta e madura – aparecem nestas questões com absoluta clareza. É como se as organizações neste momento estivessem vivendo as dificuldades criadas pelo desenvolvimento tecnológico exponencial, pelo crescente poder de reivindicação social e pelo direito à dignidade, liderado pelas minorias e diversidades. O ambiente de trabalho e a natureza das organizações precisam levar isso em conta.

Principalmente, pela premente necessidade de engajamento por propósitos – não mais por lealdade a uma empresa ou marca, nem carreira de longo prazo – na tentativa de adaptação a esta nova ordem. O processo ocorre por meio de maior abertura dos segredos ou dogmas corporativos (passando por patentes e compartilhamento entre inventores até o uso crescente de robôs e mudanças de competências profissionais), maior transparência, necessidade de admiração e respeito por valores e simplicidade – o que inclui preservar o anseio individual de participar do todo, enquanto se respeita e se considera, na diversidade, a própria individualidade.

Pensar global, em time, no coletivo, e agir no individual.

Seria este um novo paradigma para nortear os contratos de trabalho?

*Fundador do CEOlab
ronaldo.ramos@ceolab.net

A sustentabilidade como valor compartilhado

Foto de Ronaldo Ramos

Por Ronaldo Ramos*

O conceito de sustentabilidade, que surgiu há cerca de 40 anos pela preocupação com o meio ambiente, agora enfrenta o desafio de tornar-se um valor compartilhado por todos, empresas, profissionais, consumidores, cidadãos e governos. Um propósito que extrapole o meio corporativo e se espalhe pela sociedade. O significado ampliou-se ao longo do tempo e reuniu as seguintes dimensões: ecologicamente responsável, economicamente viável, socialmente justo, culturalmente diverso, renovável, reciclável, eficiente do ponto de vista da exploração dos recursos naturais, do consumo consciente e do uso respeitoso.

Nada mais importante e crucial para a sobrevivência das empresas que acompanhar e incluir a sustentabilidade no desenvolvimento da governança, dos seus profissionais e dos seus resultados. Mas como aplicar este conceito ao dia a dia, à ação mais corriqueira de uma companhia? Que medidas devem ser tomadas para que este valor seja incorporado por seus colaboradores de forma sustentável? Como garantir sua realização e a inclusão dos investimentos no orçamento da corporação?

Normalmente, a sustentabilidade é limitada a um determinado empreendimento. Antes de implementá-lo, são verificadas as condições ambientais e socioculturais da região, para beneficiar ou compensar a comunidade pelas alterações no local necessárias ao projeto e, mais do que isso, como o empreendimento pode ser desenhado de forma a considerar os anseios e os valores culturais, religiosos, ancestrais e ambientais da população. Um desafio central consiste em identificar os inputs de sustentabilidade mais afinados com a estratégia do negócio, apresentando-os nos comitês de diretoria, incorporando-os às operações e permeando o conceito e a prática por todos os níveis da empresa e seus stakeholders.

Para ampliar a adoção efetiva da sustentabilidade, a maior dificuldade das empresas brasileiras é a falta de referência em relação ao retorno dos projetos. Na segunda edição do estudo “O Estado da Gestão para a Sustentabilidade no Brasil”, realizado pela Fundação Dom Cabral em 2014, os resultados sugerem que não houve mudanças significativas no estágio de sustentabilidade em que as corporações se encontram, e o principal desafio observado em 2012 ainda é válido: diminuir a distância entre o discurso e a prática.

Como não realizam as ideias sustentáveis, as companhias desconhecem os benefícios financeiros e a eficiência que podem trazer para o processo de produção e para toda a cadeia, incluindo sua longevidade e a facilidade de renovação de licenças de operação proporcionada por elas. Governo e cidadãos têm o dever de entender e aplicar o conceito em suas iniciativas, participando das audiências públicas para a implantação de empresas e projetos, como parte da educação fundamental para cobrar a sustentabilidade. A partir dessa postura, podemos pressupor que um incentivo do Estado para a efetivação dos projetos de sustentabilidade poderia alavancar as empresas em sua gestão interna e no relacionamento com a sociedade. Já que, ao contrário da transparência, é fundamentada no pensamento sistêmico e de longo prazo.

Estamos na era da administração compartilhada e a sustentabilidade deve ser vista sob a perspectiva de toda a cadeia de valor. A busca pela excelência operacional também precisa ser entendida e estimulada pelo empresário nacional como forma de se destacar e diferenciar suas práticas e produtos no mercado global. Uma companhia que deixa de introjetar valores sustentáveis terá dificuldades no processo de internacionalização.

Segundo especialistas de RH, a empresa deve gerenciar os funcionários de modo sustentável, visando ao seu bem-estar, promovendo saúde e segurança, equilíbrio trabalho-vida, diversidade e inclusão, igualdade de gênero, recompensas justas, salário digno, promoção de desenvolvimento, comunicações internas positivas, diálogo aberto e envolvimento com a comunidade. A abordagem de temas relacionados ao conceito deve estar arraigada ao próprio negócio. É uma tarefa que assume comunicar bem os valores e a missão da própria companhia.

Uma das maiores pesquisas anuais do mundo dos executivos de sustentabilidade, “Estado dos Negócios Sustentáveis 2013”, aponta que o RH é justamente uma das funções corporativas menos engajadas quando se trata de sustentabilidade. A área de Finanças classificou-se como a de menor engajamento, não muito atrás de Desenvolvimento de Produtos, Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), Planejamento Estratégico e Marketing. Essa falta de preocupação dos principais setores das empresas reflete o atual estágio de subdesenvolvimento do valor sustentável.

Embora os CEOs considerem que o engajamento com os consumidores seja o fator de maior motivação para acelerar os investimentos em sustentabilidade, eles geralmente estão em descompasso com a motivação para a compra de produtos e serviços sustentáveis. Estudo global da Accenture revela que apenas um terço dos consumidores considera o fator sustentabilidade.

Para ter pensamento e administração pioneiros, empresas que pretendem ser sustentáveis precisam de líderes inteligentes, criativos, comprometidos e apaixonados, que cultivem a “cultura do propósito”. As melhores pessoas não se contentam com políticas de arrecadação e doações. Elas querem ver um significado em seu trabalho e à sua volta. A cultura do propósito pode ser desmembrada em três blocos: competências, características e atributos culturais. Também requer energia, resiliência, abertura e um quadro de profissionais verdadeiramente engajados nestes objetivos.

Pelo código de melhores práticas de governança corporativa publicado pelo IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) em 2010: “Governança Corporativa é o sistema pelo qual as organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre proprietários, Conselho de Administração, Diretoria e órgãos de controle. As boas práticas de Governança Corporativa convertem princípios em recomendações objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor da organização, facilitando seu acesso a recursos e contribuindo para sua longevidade.”

Cabe ao Conselho de Administração orientar o processo de definição das ferramentas e os indicadores de gestão, inclusive remuneração, de modo a vincular os temas da sustentabilidade às escolhas estratégicas. Essa postura deve ser disseminada ao longo de toda a cadeia produtiva, sendo indispensável a participação do poder público e da população para a evolução econômica responsável da sociedade. O desafio individual está em repensar nossos hábitos e costumes no sentido de dar passos pequenos e certeiros em direção ao futuro sustentável.

*Fundador do CEOlab
ronaldo.ramos@ceolab.net